Carlos Lúcio Gontijo
Dizem os advogados que a melhor forma de se perder uma causa ganha é exagerar nos argumentos e, infelizmente, a decantada sociedade moderna resolveu assim proceder. Os Estados Unidos, país de economia hegemônica no mundo, que se coloca como cão de guarda da liberdade e da democracia no planeta Terra, vêm nos demonstrando que justiça boa ou mais eficaz é aquela que fazemos com nossas próprias mãos – sem julgamento, sumária e raivosamente, ao feitio do antigo faroeste, a exemplo do que ocorreu no desfecho do caso do terrorista Bin Laden.
O culto ao grotesco, à incivilidade e à ausência de diálogo ganha cada vez mais espaço em todas as atividades e relacionamentos humanos, não se salvando nem mesmo o processo cultural, onde a receita de sucesso é sempre manter o público em estado de choque, ligado na tomada dos Rock in Rio da morte de Severinas (e Severinos) sem vida e bastante sofridas como em livro do renomado escritor João Cabral de Melo Neto.
O amigo escriba Ádlei Duarte de Carvalho, autor do romance “Triângulo Vermelho”, ao qual tivemos a honra de prefaciar, costuma dizer, a quantos lhe chegam para falar sobre poesia, que “nunca leu um bom poema que apenas lhe retratasse a alma ou a vida do poeta. Bom poema é aquele que me faz pensar sobre mim mesmo”. Da nossa parte, estamos com Ádlei, e vamos mais longe: tudo o que realmente tem valor e contribui para o crescimento espiritual do ser humano advém de visão coletiva e não do individualismo exacerbado. Convivência em sociedade requer integração, como grafamos na contracapa de nosso romance “O Contador de Formigas”: No palco solidário da arte do amor e da vida em parceria não há espaço para os que optam pelo egoísmo da carreira-solo.
Atravessamos um período em que todos andam em busca de fama e notoriedade, como se não bastasse aos indivíduos a simples constatação de ser bem-sucedido ou se ver reconhecido como bom e eficiente profissional. Todos querem o brilho dos holofotes dos meios de comunicação e, em muitos casos, extrapolam os limites de suas próprias áreas de atuação. É por essas e outras que, atualmente, instituições exponenciais, como o Judiciário e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), se nos têm apresentado como uma espécie de partido político, fenômeno que há muito contamina as nossas mais poderosas empresas jornalísticas, provando-nos que inconfessáveis interesses particulares ou de cunho corporativista não redundam em qualquer benefício salutar para a coletividade.
O exercício do governo pelo governo, da política pela política, da justiça pela justiça, da arte pela arte, da cultura pela cultura e da poesia pela poesia se perdem em si mesmos e deságuam em exageros que a nada servem. Muito pelo contrário, a tudo desservem ao tomar a decisão de proceder como agentes que ousam negar valores sociais indispensáveis, menosprezar a criatividade e distorcer o conceito estético da arte, então transformada em produto meramente comercial e incapaz de preencher os vazios da alma humana perdida na enganadora cocaína das vitrines e palcos iluminados expostos em meio à violência de ruas e avenidas Brasil afora.
Carlos Lúcio Gontijo
Poeta, escritor e jornalista
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