Quando quero contar sobre mim, são livros o que conto!

                                              Carlos Lúcio Gontijo

         

          Continuo sem dinheiro no banco, sem os tais amigos “importantes” e voltei, aposentado do INSS, para o interior. Na casa onde moro, em Santo Antônio do Monte, coloquei indicativo poético-literário na entrada e, desde o alpendre, esparramei memória e sinais de meus 26 livros parede afora. Um mar de sensibilidade intelectual distante deste mundo ainda em batalha por ouro e pedras preciosas.

          Entre os meses de abril e junho de 2022, acompanhado de minha esposa Nina, realizei bem-sucedido lançamento duplo de livros nas cidades de Santo Antônio do Monte, Belo Horizonte/Contagem, Lagoa da Prata, Festa Literária de Martins Guimarães e Moema. Todavia, nem bem me refazia de dispendiosa e idealista empreitada, movido pelo espontâneo apoio do cartunista Valdeci Almeida, que me emprestou gratuitamente o seu talento de criativo ilustrador, produzindo todo o designer gráfico de livro que escrevi a partir de seu decisivo apoio, surpreendi-me entrando com meu 26º título na gráfica, sob o título de “100 TEMPO”, no dia 16 de setembro de 2022.

          Em meio aos seguidos lançamentos duplos, fui tocado profundamente pela notícia de grave problema de câncer que atingiu Juninho, meu sobrinho de 33 anos, filho do meu irmão Marcílio Múcio. O receituário médico prescrevia remédio de 40 mil reais a dose e, enquanto a pendenga da liberação corria na Justiça, onde buscamos apoio em ação contra o Estado visando à compra do remédio, o Juninho passou por cirurgia de retirada do tumor maligno na região espinhal. E a querela na Justiça continua se arrastando e deixando cada vez mais explícita a minha impotência perante a vida.

          A dolorosa situação de saúde do Juninho levou-me à imediata reavaliação de posse que tomaria em importante Academia de Letras, sob o consequente ônus regulamentar de arcar com os custos de coquetel a seus membros e autoridades convidadas. Olhei-me no espelho da realidade e vislumbrei que o verdadeiro assento de minha obra no âmbito da poesia e da literatura se encontra alicerçado nos próprios livros – entronizado em cada página dos meus 26 livros e até nos mais de 600 artigos e mais de 1.300 editoriais publicados nos jornais Diário da Tarde, Jornal de Minas/Diário de Minas, Tribuna de Mariana, Proeste, “eisFluências” (revista cultural portuguesa), O Trem Itabirano, Observatório da Imprensa. Além e fora disso, qualquer busca de honraria não passa de tola e fútil vaidade.

          O horizonte da precariedade cultural brasileira, severamente agravado pela penumbra do momento de elevação da ignorância ao patamar de iluminado predicado e o indisfarçável avanço da indústria de entretenimento, que segue dominando os espaços culturais, em prejuízo de todo e qualquer trabalho artístico lastreado na reflexão sobre a sociedade na qual vivemos ou, simplesmente, sobrevivemos. Enfim, num tempo tão avesso à cultura, a literatura não encontra caminho e vai definhando-se no compasso da crescente escassez de leitores.

          Eu tinha 14 anos quando comecei a escrever e juntar as primeiras linhas no intuito de editar um livro, o que só veio acontecer aos 25 anos, em 1977 – ano em que lancei dois títulos: “Ventre do Mundo” e “Leite e Lua”, este prefaciado pelo renomado poeta Bueno de Rivera, que me aconselhou a aprimorar meu dom, perseverando na busca de um estilo, uma maneira pessoal de expressar. Então, fiquei dez anos sem lançar livro e, ao mesmo tempo, experimentando na própria pele que o melhor conselheiro de quem se envereda pelo exercício da arte de escrever é a lata de lixo.  Foi assim, com mais transpiração que inspiração, que nasceu o livro “Cio de Vento” em 1987. Lamentavelmente, meu amigo e prefaciador poeta Bueno de Rivera já não estava mais neste mundo: faleceu em 1982.

          A obra intitulada “100 TEMPO” deixará a gráfica na última semana de setembro e toda a edição ficará bem guardada na cidade de Contagem até a data de lançamento no mês de abril de 2024, quando comemorarei 72 anos e 45 de meu casamento com Nina, minha companheira e cúmplice na trajetória literária, que se encerrará (no modo impressão no papel) com a apresentação do novo título. Porém, antes mesmo do lançamento, o livro “100 TEMPO” será postado em meu site (no ar desde 05 de junho de 2005), numa homenagem ao público leitor que me acompanha há tantos anos e, virtualmente, poderá manter contato comigo até o fim do combustível do candeeiro espiritual que me fornece energia e luz em minha passageira existência terrestre.

          Carlos Lúcio Gontijo

          Poeta, escritor e jornalista

         www.carlosluciogontijo.jor.br

         16 de setembro de 2022