Carlos Lúcio Gontijo
No dia primeiro de julho deste ano de 2011, no município de Santo Antônio do Monte, no Centro-Oeste de Minas Gerais, estivemos na Comunidade Terapêutica São Francisco, reverenciado santo da Igreja Católica, que teve o filosófico verso de sua oração (“é dando que se recebe”) transgredido e desrespeitado pela classe política, que o rebaixou a sinônimo de corrupção e troca de favores ilícitos na fonte e, mais tarde, criminosos, pois retiram verbas de setores importantes, entre eles a saúde pública, onde o atendimento precário é responsável pela morte de muitos brasileiros.
Contudo, na comunidade em questão, São Francisco de Assis se vê realmente homenageado (e reabilitado), uma vez que ali se presta valioso trabalho cristão de acolhimento aos que buscam tratamento para o vício do consumo de drogas e álcool, que tanto mal têm levado às famílias brasileiras, que assistem à corrosão de seus pilares toda vez que um de seus membros é seduzido pelos agentes do mundo do tráfico.
Imbuída de sensibilidade e compromisso social, Maria Ortélia de Castro Melo, professora, escritora e ativista cultural, tomou a iniciativa de elaborar uma versão bem humorada da história infantil “Branca de Neve e os Sete Anões”, que foi encenada com brilhantismo pelos internos em processo de erradicação do vício que os atormenta, demonstrando claramente a importância do acesso democratizado às artes como mecanismo capaz de tanto auxiliar no tratamento dos dependentes químicos quanto servir de barreira à materialização de tal infortúnio, que se transformou em problema da sociedade como um todo.
Tivemos o prazer de rever o ex-prefeito da cidade de Santo Antônio do Monte, Getúlio Batista de Oliveira, que no ano de 1977, nos outorgou diploma de honra ao mérito, sob proposição de então vereador José Magela Couto. Naquele momento, fizemos a absoluta questão de cumprimentá-lo por patrocinar tão auspiciosa obra de caráter social e cristão, em época que a droga invade praticamente todos os setores e atividades da sociedade brasileira, colocando-nos próximos à efetivação de um estado embebido no aniquilador domínio do narcotráfico, jogando a república nos braços da narcocracia.
Getúlio Batista, não tem mais qualquer ambição política, mas se nos apresenta sob o pleno exercício do inalienável mandato de cidadão que se sente responsável pelo destino das pessoas. Ou seja, ele nos passa a visão fraterna de que não é necessário mandato político para o incremento de ações no campo da prática do amor ao próximo, do qual tanto carece a nossa malcuidada lavoura social.
Ao me deparar com Getúlio Batista de Oliveira espargindo contentamento, pelo sucesso da obra comunitária fundada e presidida por ele, remontei-me a políticos que jamais largam o osso da disputa por mandatos, ainda que em idade avançada, como se a única maneira de eles servirem à sociedade fosse postar debaixo do braço algum diploma político, como aconteceu recentemente com o ex-presidente Itamar Franco, que aos 80 anos concorreu (e venceu) a uma cadeira de senador por oito anos, para alegria do suplente, José Perrela, que agora foi premiado com a sua morte, ganhando (de mão-beijada) sete anos e meio de mandato.
Getúlio Batista, com sua capacidade empreendedora, e Maria Ortélia (a Telinha), com seu talento artístico-literário, nos passaram naquele primeiro de julho a suprema e cristã lição de responsabilidade social, enquanto aos internos em tratamento São Francisco de Assis derramava a divina força do livre arbítrio, concedendo-lhes a graça da indispensável consciência de que “o recomeço acontece no horizonte do querer”.
Carlos Lúcio Gontijo
Poeta, escritor e jornalista
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