Quando quero contar sobre mim, são livros o que conto!

É preciso comedimento nas homenagens

Carlos Lúcio Gontijo

Ao entrevistar a cantora Rosana, o apresentador de tevê Ratinho indagou-lhe qual era a melhor cantora brasileira. Sem pestanejar a cantora respondeu: Leny Andrade. Então, para surpresa de todos, Ratinho confessou nunca ter ouvido falar em tal cantora. É triste, mas coisas como essas são comuns no Brasil, onde uma das grandes contradições é a aceitação da ideia de que toda pessoa detentora de popularidade tem o direito de se nos apresentar vazia de conhecimento e informação.

Lamentavelmente, o segmento cultural acompanha o mesmo vício, considerando de forma absolutamente errônea que as camadas populares gostam de produtos culturais ruins e desprovidos de qualquer laivo de intelectualidade mais elevado – o que não é o mesmo que hermetismo literário inócuo.

O fundador da “Borrachalioteca” em Sabará, nosso estimado amigo Marcos Túlio Damascena, foi convidado a levar seu projeto de leitura a um presídio da histórica cidade mineira. Imaginou ele que os detentos iriam dar preferência aos livros de autoajuda; todavia os encarcerados optaram, em sua imensa maioria, pela viagem contida nos livros de poesia.

Assim como existe o erro de visão cultural na análise do mercado de que dispõe, detectamos o equívoco que ocorre na constituição de muitas academias de letras Brasil afora, que surgem como instrumento de troca de favores entre amigos, formando uma “igrejinha” que dispensa inclusive a necessidade de os confrades e confreiras terem pelo menos uma obra editada em verso ou prosa.

As academias de letras existem para participar, incrementar e contribuir tanto com projetos ou eventos que busquem incentivar o gosto pela leitura quanto para auxiliar na visibilidade da produção cultural dos que lidam com a arte da palavra escrita. Daí a justificativa óbvia para a exigência moral, ética e salutar de que seus membros tenham pelo menos um livro impresso, pois sem essa providência estatutária até a cobrança de luvas, mensalidade ou anuidade se torna de difícil execução.

Não é à toa, portanto, que as academias de letras costumam cobrar anuidade ou mensalidade de seus membros, pois além de possibilitar-lhes determinada independência financeira e certo distanciamento da precisão de permanentemente esmolar favores políticos, a exigência de algum pagamento afasta os que não têm amor verdadeiro pela cultura literária e querem tão-somente ostentar título, ainda que sem mérito algum (de graça, até injeção na testa, diz o ditado).

Enfim, medalhas, diplomas, academias de letras e demais honrarias devem ser tomados como maneira de premiar a quem realmente se destaca naquilo que produz ou faz e essa regra precisa ser rigidamente obedecida, uma vez que, ao se misturar joio e trigo, toda a boa intenção da homenagem se perde e esboroa, chegando mesmo a constranger o laureado de reconhecido valor.

A verdade lapidar é que nem o Nobel da Paz se encontra livre de contaminação. Como pode o presidente de um país reconhecidamente senhor da intervenção, da ingerência, da invasão e da guerra, como é caso do mandatário norte-americano, ser contemplado com o prêmio Nobel da Paz?

Ademais, caro leitor e cara leitora, quando nos deparamos com fila de pessoas recebendo, por exemplo, a “Medalha da Inconfidência Mineira”, nos pomos a imaginar: meu Deus, que mundo é esse que não toma jeito, apesar de tanta figura competente, iluminada, realizadora, proba, inteligente, cristã e solidária no comando de nossas instituições públicas e privadas?

Postado em 11/03/2010

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