Quando quero contar sobre mim, são livros o que conto!

Carlos Lúcio Gontijo

Já grafamos em nossos livros que, em Minas Gerais, as mineradoras movem mais montanhas do que a fé. Infelizmente tal afirmação, apesar de verdade irretorquível, não é levada em conta, com as grandes companhias mineradoras recebendo loas de todos os setores da sociedade, que frequentemente lhes concedem até o direito (e a honra) de se nos apresentarem como patrocinadoras de encontros e seminários voltados à discussão dos problemas ambientais que nos afligem.

Assistimos entristecidos, em momento de grave crise econômica na Europa, à luzidia pompa em torno da realização da Rio+20, que não contará com a participação decisiva de alguns dos chamados países desenvolvidos, pois tais nações não querem assumir compromissos com ações inibidoras da poluição da atmosfera terrestre. Ou seja, temos pela frente mais um convescote com palco montado e tudo o mais, quando bastaria a simples montagem de uma videoconferência sem o dispendioso deslocamento.

Acreditamos que os povos do planeta Terra somente assistirão a união em torno da questão do meio ambiente quando a natureza, que não reage, mas apenas se vinga dos maus-tratos que lhe desferimos, começar a sangrar, ameaçando a vida de todos os seres vivos. O desenvolvimento sustentável de que falam os governantes, economistas e ambientalistas não passa de mera falácia, pois dentro do consumismo desenfreado em que se baseia o capitalismo não há como se implantar avanço econômico assentado na sustentabilidade.

O panorama social em que vivemos é alicerçado num individualismo tão extremo que as pessoas andam “deletando” umas às outras, como se estivessem dotadas de um computador interno, alojado bem no centro de seu cérebro, comandando seus posicionamentos e emoções. Estamos cada vez mais preparados para aceitar apenas o que nos é favorável e, assim, não sabemos mais lidar com as frustações – um fenômeno que tanto faz parte da vida quanto é necessário ao nosso crescimento como ser humano e como cidadão.

Outro dia, assistindo a um documentário da TV Câmara levado ao ar madrugada adentro, tomamos conhecimento de que a casa em que o poeta Carlos Drummond de Andrade passou sua infância na zona rural de Itabira foi destruída, por ter sido erguida em subsolo rico em minério de ferro. Pois bem, a mineradora autora do insensível feito cuidou de construir uma réplica que (acreditem!) está em local cuja paisagem entra em choque explícito com o pensamento, a filosofia e a poesia do Poeta Maior, uma vez que todas as janelas da casa se abrem para a exposição de rejeitos da mineração, lembrando os versos do poema “Triste horizonte”, escrito por Drummond em 1976, para justificar sua decisão de não regressar nem a Belo Horizonte nem a Minas Gerais. Morreu em 1987. Não pisou em solo mineiro novamente, desde a criação daquele poema: “Não voltarei para ver o que não merece ser visto, o que merece ser esquecido, se revogado não pode ser”.

Política cultural, pelo visto, não é mesmo um projeto real no Brasil, onde os leitores são cada vez mais escassos e os grandes autores são, por isso, mais citados em discursos de político ou autoridade desejosa de expor pretensa erudição do que realmente lidos. E o pior de tudo é que Conceição do Mato Dentro, bem próximo dali, se prepara para se transformar em espelho perfeito da cratera lunar que se pode observar no solo itabirano.

O rico convescote repleto de ambientalistas e representantes de ONGs de todo canto e lugar, sob os holofotes da mídia e envoltos em belos e artísticos painéis, não bate com os esgotos a céu aberto e os rios brasileiros e demais países em desenvolvimento mundo afora, onde em pleno século XXI os recursos hídricos disponíveis são usados como depósito de lixo. Enfim, a insofismável constatação é que estamos distantes de qualquer compromisso com as próximas gerações e, sob a égide do extremo egoísmo, agimos como se não houvesse amanhã. Não é à toa que os países mais desenvolvidos têm o desplante de se comportar como senhores do planeta Terra, esquecidos de que habitamos a mesma pequena ilha que gira em torno do Sol e que, por isso mesmo, todos nós seremos regidos por um mesmo destino: a vida ou a morte, segundo nossa relação com a mãe natureza.

Carlos Lúcio Gontijo

Poeta, escritor e jornalista

www.carlosluciogontijo.jor.br

13/06/2012