Carlos Lúcio Gontijo
Como nos diz Cícero, político e orador romano que viveu a 106 anos antes de Cristo: “não há tolice, por maior que seja ela, que não encontre um devotado defensor”. É precisamente por isso que, mais que divulgar as notícias do dia-a-dia, cabe aos meios de comunicação comentá-las, antes que o jogo de imagens supostamente reais conduza as pessoas à fantasia das comoções e heróis de mentira.
Lamentavelmente, devido à quase inexistência de partidos políticos na acepção do termo – não passam de meras siglas -, o eleitor brasileiro ainda hoje anda à procura de um salvador da pátria. Apequenar o período eleitoral impondo-lhe a discussão de temas irrelevantes, numa tentativa de confundir o eleitor menos dotado intelectualmente ou detentor de condição material inferior, é a busca dos candidatos ao sufrágio popular, que no fundo gostariam de ser detentores do dom de picadeiro ostentado pelo humorista Tiririca.
As eleições presidenciais de 2010 nos demonstraram de maneira contundente que permanecemos distantes da construção de panorama social em que a velha assertiva de Cícero deixa de valer entre nós, pois parte significativa de nossos políticos continua tanto defendendo quanto levando a população brasileira a se perder na discussão de tolices que terminam por conduzi-la à constatação de infelicidade maior que a própria miséria intelectual que a falta de acesso a escolas de qualidade lhe reservou, fazendo-a em alguns casos a eleger ditadores cruéis que agem livremente ungidos pela democracia das urnas.
Pode-se afirmar que se o abominável homem das neves não existe – o abominável político das urnas é fato mais que comprovado no eternamente precário quadro partidário brasileiro que, vergonhosamente, precisa de votação de lei pautada no clamor da sociedade para tentar inviabilizar a inscrição de político desprovido de ficha limpa, quando a iniciativa deveria partir das próprias agremiações políticas.
Clara e visivelmente a disputa eleitoral se enterrou e sepultou a si mesma ao propugnar pela iniciativa de propagar a discórdia e dividir uma sociedade reconhecida pela tolerância e convivência harmoniosa entre raças, ideologias, seitas e religiões. Assistimos a posturas extremas no tratamento de assuntos e temas complexos, como se tudo pudesse ser resolvido na base do sim e do não, do contra e a favor. Em vez de a luz da argumentação sobrou a obscuridade da radicalização, que é o fio condutor da infantilização dos atos humanos, pois através dela os homens se tornam crianças e se propõem a tudo destruir como se tudo fosse simples brinquedo, posto que a destruição é a maneira mais fácil de o radical (como a criança) demonstrar a sua pretensa força.
Estamos na lavra de um romance novo – Quando a vez é do mar -, com o qual pretendemos comemorar, em abril de 2012, 60 anos de vida dedicada à literatura e ao jornalismo. E é com uma frase desse novo trabalho (nosso 14º livro) que fechamos este artigo: O homem é mesmo um animal político, mas todas as vezes em que age politicamente atua como simples animal.
Carlos Lúcio Gontijo
Poeta, escritor e jornalista