Carlos Lúcio Gontijo
Tem muita gente que discute política sob a ótica de seus próprios interesses: um cargo aqui, outro acolá e favores de toda a espécie, incluindo alguma arrumação em que pinga salário, com anotação de horas extras, na conta bancária, sem a devida contrapartida de serviço real – em síntese tudo se pratica em prol da enganação, seguindo a disseminada ideia que garante não ser de ninguém todo bem sob o rótulo de coisa pública.
Nesse sentido, assisto a um elevado número de pessoas bem situadas financeiramente contrariadas com os juros baixos que não lhes remunera o capital como antigamente, num tempo em que a inflação corria solta e os mais pobres, sem dinheiro para as rentáveis aplicações, padeciam com o agravamento de sua miséria.
Traduzindo o vezo de verdadeira perseguição ao povo, assinalamos o desrespeito pelo cidadão trabalhador que, mesmo sob o desestímulo da incidência do fator previdenciário, toma a decisão de se aposentar. Incrivelmente, a cruel sina que o espera começa a se esboçar logo de início, quando ele recebe a carta de aposentadoria. Semana passada, eu recebi a minha aterrorizante missiva previdenciária, onde o detalhista esmero burocrático cuidou de deixar explícita a minha expectativa de vida: 20 anos e 5 meses. Prova de tamanha insensibilidade governamental acredito não haver em país algum deste planeta em que vivemos.
Ainda bem que, para compensar o meu dissabor, a poetisa e escritora portuguesa Carmo Vasconcelos inseriu, no seu espaço virtual “Fênix”, uma coletânea relativa ao trabalho literário por mim desenvolvido ao longo dos últimos 37 anos, sob o título de “Transcrição de Silêncios”, abrindo-me clareiras em terras de Portugal.
Se hoje são escassos os leitores entre nós, afianço-lhes não alimentar a mínima esperança de que o gosto pela leitura seja estabelecido no Brasil, pois os programas que são implantados com tal intenção não observam sequer a necessidade de destinar às escolas livros que atraiam alunos com o devido linguajar e costume de cada localidade. Ou seja, é preciso dar oportunidade à regionalização literária, levando assim os autores para dentro das salas de aula, o que redundaria no fim dos mitos que cercam a atividade de escritor, à medida que as crianças e jovens tomassem contato com poetas e escritores e se sentissem capazes de também criar poemas e escrever contos e romances.
Todavia não dá para vislumbrar o nascimento de luzes promissoras nos horizontes da educação e da cultura de nosso Brasil, quando nos deparamos, por exemplo, com notícia de existência de escola em São Paulo, cidade situada no centro econômico do país, que funciona de maneira provisória há mais de 20 anos. Trata-se da Escola Municipal Professora Thereza Maciel de Paula, localizada no bairro Santo André, onde crianças estudam entre paredes de madeira, salas desprovidas de boa ventilação e com pátio insuficiente tanto para a recreação quanto para aulas de educação física, apesar de a instituição constar oficialmente como montada em prédio com quadra nos registros do Ministério da Educação. E como desgraça pouca é bobagem, o local chegou até mesmo a ser interditado devido ao domínio de usuários de drogas nas madrugadas.
Não podemos, portanto, nos surpreender com o avanço da violência entre os menores, que se nos apresentam maiores o bastante para roubar e matar, mas são inimputáveis, ainda que sejam considerados aptos a votar com 16 anos. Os bandidos (de todos os tamanhos e idades) não rezam na nomenclatura da sociedade tida como de bem; seguem outras etiquetas e não estão nem aí para esse negócio de passeata pela paz ou o pedido de socorro das famílias, que não dispõem de acesso democrático a escolas de qualidade para seus filhos nem de tratamento digno na doentia área de saúde. Trocando em miúdos, o descaso e a violência são fenômenos poluidores impregnados em todos os lugares – nem o ar que respiramos nem a nossa aposentadoria deles escapam!
Carlos Lúcio Gontijo
Poeta, escritor e jornalista
18 de junho de 2013.