Carlos Lúcio Gontijo
Estamos numa fase em que dispensamos cargos e nos entregamos, inteiramente, ao encargo de cuidar do que efetivamente nos interessa: os 16 livros que escrevemos. Nunca observamos tanta gente reacionária e derramando intolerância pelos quatro cantos da boca e das ondas virtuais da internet quanto vemos nos dias de hoje. O índice de desprendimento nunca foi tão baixo, a moda mais comum no reino do egoísmo é a pessoa montar palco sob a intenção de brilhar sozinha, sem qualquer compromisso com os demais componentes do evento programado, ainda que seja à custa de patrocinadores ou, mais grave, realizado com dinheiro público.
Fomos a Belo Horizonte buscar as impressões gráficas dos livros “Duducha e o CD de mortadela” (2ª edição) e “Lelé, a formiga travessa”, obra inédita ilustrada por Vilma Antônia da Silva, a Vilminha, detentora de extraordinário talento. E daqui a uns 15 dias, teremos em nossas mãos o livro “Poesia de romance e outros versos” – obra literária contendo 260 páginas, dentre as quais incluímos dedicatória ao saudoso amigo Wilson Ricardo, que por muitas vezes nos auxiliou na dura tarefa de editar livro neste Brasil de tão poucos leitores.
Nossa trajetória nos ensinou que a proximidade, em muitos casos, prefere puxar-nos o tapete que nos premiar com a gentileza de estendê-los. Por sabermos dessa dura realidade, é que calou-nos profundamente no peito a espontânea iniciativa do maestro Otaviano José Coimbra (o popular “Vai”) de musicar o poema “Sangue Montense”, que foi publicado pela primeira vez no livro “O menino dos olhos maduros”, há mais de dez anos.
O nosso contato com o facebook advém da procura de abrir espaço à divulgação de nosso site, mas apesar de não sermos frequentadores assíduos das redes sociais, podemos detectar a existência de pessoas se utilizando da internet como maneira de se impor perante administrações públicas que ainda estão em período de adaptação perante a comunicação informatizada e, não raro, são ludibriadas por falsos alardes e terminam reverenciando cidadãos espertos, oportunistas e sem a projeção decantada pelos usuários do mundo virtual.
Contudo, se constatamos situações espúrias no âmbito da internet, temos casos como o do poeta angolano Domingos Filipe Muenho, que certa feita visitou o nosso site e, com o passar do tempo, tomou a liberdade de nos pedir que fizesse a revisão de seu livro, cuja edição é um sonho alimentado por ele, apesar de toda a dificuldade financeira que experimenta naquele país, onde a população convive com vasto quadro de miséria. Filipe deseja editar um simples livreto, com apenas 30 páginas, mas não dispõe do valor absurdamente elevado, acompanhando o perverso panorama, onde a prioridade máxima é tão-somente alimentar o corpo sob a fatídica ameaça de inanição.
Resolvemos ajudar o angolano Domingos Filipe, que segue em frente sem nem ter com quem contar, enquanto nós usufruímos do estímulo musical do maestro “Vai” e o apoio de alguns bons amigos, que agem como se fossem ferramentas destinadas a quebrar o gelo da indiferença que nos rodeia e tenta nos envolver, furtivamente, com seus tentáculos mantidos sob sua espessa manta escura: traje a rigor tecido nos teares da diabólica maldade com que envenenam suas ações cotidianas.
Carlos Lúcio Gontijo
Poeta, escritor e jornalista
2 de setembro de 2013